Mais de 16 horas de viagem por dia dirigindo um caminhão do Rio Grande do Sul a São Paulo, Goiânia e Minas Gerais. Essa era a vida de um motorista que teve seus direitos reconhecidos pela Justiça após acionar a empresa para a qual trabalhava.
A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4), no Rio Grande do Sul, julgou o caso e condenou a empresa por ‘dano existencial’ ao trabalhador que, por causa da jornada extensiva, foi privado do convívio familiar, do direito ao lazer e à instrução.
O caminhoneiro conseguiu comprovar, ainda, que não recebia horas extras, que tinha de preencher a folha de ponto com horas a menos por ordem da empresa e tinha folga somente a cada 12 dias. Os tacógrafos (discos que registram as atividades do veículo, instalados dentro dos velocímetros) foram requeridos e comprovaram o que o trabalhador dizia.
Por isso, além de cobrar horas extras não pagas, o motorista pediu uma indenização por danos morais causados pelo excesso de trabalho.
O desembargador Raul Zoratto Sanvicente afirmou ao portal Conjur que a prática reiterada de obrigar empregados ao cumprimento de jornadas de trabalho tão excessivas não deve gerar apenas o pagamento de horas extras, o que restringe o problema à uma visão monetarista. Para ele, isso é “inadmissível em se tratando de direitos sociais”.
O psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), Cristian Dunker explica que o conceito de “dano existencial” usado nesse caso, foi correto porque as consequências são severas para a vida do trabalhador, que fica vulnerável a quadros de depressão e ansiedade. Esses casos, complementa, são comuns e podem se tornar graves. “O trabalhador é exposto a uma situação de tensão corrosiva a longo prazo”.
Dunker avalia que a decisão do TRT-4 foi acertada porque, apesar da falta de sintomas físicos, os juízes enxergaram o dano psicológico ao condenarem a empresa por dano existencial.
“Nossa legislação ainda não consegue captar isso por estar presa aos sintomas. Ou o trabalhador prova com sintomas ou ele se submete a uma situação de trabalho que corrói os laços sociais. E não há como contabilizar essas perdas juridicamente. Mas os juízes enxergaram essa realidade”, analisa o psicanalista.
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